Marlene em um momento intimista muito especial,
A fotografa portuguesa Marlene Oliveira de Portugal veio para conhecer um pouco do Brasil, passou por São Paulo, Niterói, Petrópolis e Rio de Janeiro e tirou alguns dias para ficar em Ribeirão Preto, foi a Brodowsk, Batatais e Altinópolis também para um equilíbrio entre a cultura local e as belezas naturais.
Marlene tem anfitrião, Victor Estevão em Ribeirão que a acompanha por todo o trajeto, apresentado principalmente nossa região e vivenciando junto a vidas noturna da cidade de Ribeirão, restaurantes, bares, musica...o que a cidade oferece neste momento., começo de janeiro.
Em bate papo, lembra do choque cultural, principalmente do Rio de Janeiro, os contrastes humanos, mas ressalta a receptividade, o brasileiro aparenta uma alegria mais clara.
Cafée de Flore, onde intelectuais como Sartre se reuniam;
Marlene Fernandes de Oliveira nasceu em Torres Vedras (Portugal) em Julho de 1979. Com gosto particular pelas artes visuais, nomeadamente pintura, fotografia e cinema, ingressou em 1997 num curso superior de Comunicação Audiovisual do IPP (instituto Politécnico de Porto). Com formação em vídeo, cinema, multimídia e fotografia acabou por se dedicar exclusivamente a esta ultima desde 2000.
Em 2001, foi responsável por um levantamento fotográfico
sobre as obras na Região Histórica do Porto para a Prefeitura da Cidade. Já em
2002, fe\ um trabalho fotográfico sobre a cidade de Lisboa para integrar o
acervo do arquivo fotográfico municipal da Cidade.
Em 2003, participou de um workshop da World Press Photo em
Amsterdam que resultou numa exposição coletiva e na publicação de um livro
(Asia-Europe Foundation & Word Press Photo. “Migrations”. 2004. Amsterdam
World Press Photo).
Tendo uma ligação muito especial com Paris, cidade que visita desde a infância, fez um conjunto de imagens intitulado "Paris para um
turista”. Desde 2003 tem trabalhado na área de fotografia de Arquitetura e Decoração,
tendo um grande interesse pelos espaços, ambientes e pela forma como os
vivemos, Nesse sentido tem participado em algumas publicações na área da
arquitetura e de recuperação de espaços.
O meu Brasil
Antes de sair de Portugal avisaram-me para o
choque que iria sentir ao chegar ao Brasil, nomeadamente em relação ao Rio de
Janeiro. Nós temos pobreza, mas o contraste entre o rico e o pobre não é tão
notório.
A primeira impressão na chegada a São Paulo
revela-se como uma enorme esfera de ruído visual. As cores das casas são
gritantes, cada uma na sua, e cada um publicita o seu negócio de forma muito
simples e eficaz: pinta uns letreiros de outra cor forte na parede da casa em
questão para que não restem quaiquer dúvidas. Depois todas estas casas estão
ligadas entre si por uma grande teia de fios eléctricos suspensos por cima das
nossas cabeças, para onde quer que nos viremos.
Chegamos à estação Tietê e somos arrastados atrás
de uma multidão que se movimenta frenéticamente em todas as direcções. O meu
anfitrião espera a minha reacção e confronta-me com o facto de na Europa não
haver toda esta quantidade de pessoas num local semelhante. Eu páro um momento
e fico a pensar... existe sim!!! (não em Portugal) mas há qualquer coisa de
muito diferente! Esta massa de gente, na Europa, numa central de transportes de
uma grande cidade, vem vestida com os seus trajes monocromáticos e deslocam-se
em silêncio de forma disciplinada. Estas pessoas são coloridas, informais, são
pessoas simples de chinelas que riem, falam, fazem muito barulho e
movimentam-se com muita energia.
Primeiro ponto de visita, sou levada para o
edifício do Banespa, um edifício bem no centro de São Paulo e eis que a
primeira imagem que tenho da rua onde se encontra o edifício, é a de uma
rapariga com um ar de quem já não pertence a este mundo, deitada no meio de uns
cobertores, em soutien à porta de um edifício todo importantão! Acho que o
Victor nem a vê, nem as outras pessoas que por ali passam! Eu estou assustada a
imaginar a vida daquela rapariga tão bonita, mas completamente destruída.
À medida que vamos circulando pela cidade vou-me
apercebendo da quantidade de gente que vive literalmente “acampada” no meio da
cidade sem condições absolutamente nenhumas. Eu estou em choque, passei a vida
a ir a sítios onde a miséria estava tão bem escondida que agora sinto-me como
se tivesse apanhado um estalo ou um soco no estômago. A miséria aqui não tem
vergonha, é uma realidade com a qual somos confrontados permanentemente.
À medida que vamos vivenciando os lugares, as
primeiras impressões vão-se desvanacendo e o encantamento vai crescendo e ficam
as memórias agradáveis dos momentos passados em sítios como o edifício Banespa
ou o Martinelli, o parque Ibirapuera, a Avenida Paulista, as lanchonetes e os
batidos de frutas, muitas das quais nem tinha sequer ouvido falar.
Chega a hora de ir para o Rio de Janeiro, a cidade
maravilhosa, a expectativa é enorme.
Acredito que chegar ao Rio de Janeiro de avião deve
ser uma experiência inesquecível pelas melhores razões, mas posso assegurar que
chegar de carro também o é, sobretudo com o trânsito de véspera de reveillon!!!
Começamos a entrar no Rio de Janeiro, avisa-me o meu anfitrião. Sério? Mas são
só favelas!!! Andamos dez quilometros, vinte, trinta, quarenta... e as favelas
parecem não ter fim. Ainda não vi um bairro que não fosse uma favela. O
trânsito começa a parar e crescem os vendedores de tudo na beira da estrada,
armados de geleiras, que de cinco em cinco metro gritam na janela para nos
venderem sumos, cerveja (cerveja??? a condutores?), água gelada, biscoitos de
polvilho e tudo o que possa distrair a nossa atenção do facto de estarmos
parados no trânsito, meio de um monte de bairros de lata.
Finalmente chegamos à famosa e vislumbro uma
cidade linda, com uma luz capaz de nos hipnotizar!
Por aqui ficamos uns dias a conhecer a cidade, as
praias e onde quer que vamos, todas as pessoas
gritam para nos venderem qualquer coisa, toda a cidade grita! A vontade
inicial de fugir dali o mais rápido possível vai dando lugar a uma vontade de
permanecer, de conhecer melhor, as pessoas não fogem de falar com estranhos,
numa das cidades mais violentas do mundo. Quem nos recebe, fá-lo de coração
aberto com uma disponibilidade total de nos dar a conhecer os locais, do nos
acompanhar e de nos conhecer também.
A minha degustação de sabores exóticos vai
continuando de cada vez que nos cruzamos com frutarias ou árvores de frutos
espalhadas pela rua. Eu continuo alerta, à espera do instante em que aparece um
homem com um pau na mão por estarmos a apanhar fruta da árvore na rua e que
temos que fugir a correr para não levar tamanha sova, mas o Victor diz-me para
não me preocupar que isso não vai acontecer!!!
A sensação de que existe algo de muito especial
com esta cultura vai crescendo, e mais ainda com a estadia na cidade do meu
anfitrião, Ribeirão Preto. As pessoas não estão stressadas, sorriem, conversam
descontraídamente com quem aparece ou com quem as aborda na rua. Vivem o momento
sem estar a pensar no que os outros estão a pensar, sem pensar nas
consequências de tudo e mais alguma coisa.
Não vejo ninguém a lamentar-se de absolutamente
nada, não se ouve falar em depressão, nem em problemas económicos, nem nas
artroses, nem no reumático, nem na falta do dinheiro para os medicamentos. No
santuário da Nossa Senhora Aparecida pude confirmar que de facto, as pessoas
são agradecidas por aquilo que conseguem obter e por aquilo que são.
Quando chega a hora de ir embora a sensação de um local
virgem para nós, dá lugar à imagem que de alguma forma já pertencemos ali, já
reconhecemos uma série de locais, guardamos emoções das nossas experiências nos
mesmos, já conhecemos um pouco da cultura, fazemos já um pouco parte dela e da
vida das pessoas com quem nos cruzámos e por isso, a vontade de voltar é enorme
e a tristeza por ter que partir, também.
Saudades de Portugal.
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